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UM ATO LIVRE É AQUELE QUE SE SABE ATRAVESSADO PELO OUTRO



15/02/2020

Texto produzido por Gilceley Santos no Seminário SublimeAção 2019

Falava no meu último seminário sobre sermos Múltiplos, feitos de versos, de sermos diversos,

E que um ato livre é aquele que se sabe atravessado pelo Outro.

Peter Pelbart em ensaios do assombro cita de Josep Rafaneli

“Um indivíduo não consiste jamais nele mesmo. Não somos seres senão nas maneiras de ser, ou ainda nas relações de composição que provêm do fato de que: existir é fazer existir a existência de outros seres.”

E acrescento

Reconhecendo em si mesmo o fato de sermos polimorfos por que múltiplos, mas também

Ao mesmo tempo em dar existência ao Outro.

Sinto-me convocada

Pelo desejo de continuar neste modo. A forma que me ocupa neste tempo é a de me deixar atravessar cada vez mais por tudo que há e com isso desenvolver essa possibilidade de intervir na realidade de modo que aquilo que está na experiência contemporânea possa ganhar uma linguagem nova que pretende deslocar onde for possível a fala dominante, mobilizar o coletivo mais amplo possível, da forma mais abrangente possível. Este é o meu sinthoma com H.

Hoje sei que encontro neste lugar minha potência maior.

O AçãoSublime como sabem, foi este ano um ato proposto por mim que foi vivido por alguns deste grupo.

Para o ano que vem pretendo ampliar essa ação.

Isso porque:

Quando um corpo não aguenta mais é preciso desorganiza-se,

E assim criar um dizer.

E o que este corpo como tantos outros não aguenta mais?

O abuso!

O abuso sobre os mais fragilizados e que por sua vez nos fragiliza também caso não revertamos essa afetação em uma ação sublime.

Temos falado sobre o discurso do mestre localizado na cultura. Hegemonicamente

Esse discurso é como nos diz Suely Rolnik, Antropo-falo-étnico-ego-logo-cêntrico, sob o domínio da ordem Capitalistica que abarca tudo isso. E como se sabe é nas mulheres, nas crianças, nos corpos negros, nos corpos desprovidos do essencial para uma vida digna, nos povos originários, nas sexualidades divergentes do padrão imposto , nos adoecidos da alma, nos modos excluídos de existir por não serem uteis ao ditames capitalisticos onde mais incide a Pulsão mortífera.

Se ficamos apáticos diante do que sofremos é inevitável o adoecimento de toda ordem.

O mal-estar que se instala não incide apenas sobre o escravo mas também ao que se oferece como amo.

Lugar este insustentável pois sua vertente é imaginária.

E também ele desconhece o que lhe causa. Angústia garantida, que leva à colapsos. Muitas vezes abreviando inclusive a vida concreta.

Ego teme a despersonalização e com ela seu desaparecimento. Sem saber que o que derrete com isso não é sua existência, mas sim “Um Modo besta” de sobrevivência.

A proposta, portanto, é seguirmos juntos inventando com quem mais for possível e onde mais pudermos ir, uma escuta que propicie semear germes de vida.

Nossa intervenção no modo de uma escuta singular pode ser um pouco de mundo Outro, nesse universo de repetição regido pelo insistente “mesmo”.

A oferta não é apenas para aqueles em quem vamos intervir, mas para todos incluídos no processo, e, ouso dizer que somos nós os pseudo interventores, quem sofre a maior sublimação.

Constitui um vigoroso exercício para nos fortalecer até o próximo impossível, sempre passível de ser deslocado.

E como precisamos nos

“desloucar" !

Desde 1500 temos mais invasão que descobrimento.

Nossa origem cultural foi abusadora traumática e ainda está recalcada. Poucos puderam elaborar o peso que nosso corpo carrega dessa história de abusos.

Invadidos primeiramente por Europeus fugidos de dois séculos de inquisição, misturados a indígenas usurpados de todas as formas, mais tarde somados à africanos sequestrados, totalmente desmantelados de sua vida de origem, torturados e humilhados.

Para nos curarmos de uma ferida deste tamanho é preciso entrar em contato com a existência dessa dor que ainda vibra em nossos corpos.

Quanto maior a abertura para esse tempo real, às afetações dessa história coletiva presente em nossos corpos, maior será a potência de tocar a outros. Muitos nada sabem sobre essas afetações, apenas vivem suas ressonâncias num corpo molecularmente anestesiado.

Propomos um devir do ainda invisível, um lugar sempre a se chegar, para compreendemos a urgência e o cuidado que precisamos ter com a vida.

Sigo sem a pretensão de mudar “O mundo”, mas com a convicção de que podemos fazer TUDO o que podemos fazer.

E “isso”, se não muda o mundo, muda UM mundo.

Este a que temos acesso.

A ação sublime é continuar a descobrir novos modos

de nos musicar.

Criar novas composições,

e seguir tocando em frente.

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